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Conheça a história da primeira enóloga mulher da Argentina, fundadora de um império do vinho, que inclui um hotel de alto luxo em Mendoza.

 

Susana Balbo queria ser física nuclear. Por receio do clima de insegurança nas universidades naquela época, com perseguições durante a ditadura militar, os pais não permitiram que ela deixasse sua cidade natal, Mendoza, para estudar. Bem, a julgar pela capacidade de trabalho e obstinação de Susana, a comunidade científica perdeu alguém que teria feito contribuições importantes na área. Em compensação, o mundo do vinho ganhou uma figura visionária e fundamental para o setor na Argentina.

Primeira mulher a se formar em enologia em seu país, Susana acumula alguns feitos na carreira. O mais recente deles é ter ingressado no Decanter Hall of Fame, em outubro, da prestigiosa revista britânica Decanter. A honraria, que já foi dada a personalidades como Jancis Robinson e Robert Parker, reconhece nomes responsáveis por contribuições excepcionais na enologia e vinicultura.

Outro feito de Susana foi o de investir no potencial da uva Torrontés e elevar seu status. A cepa sempre foi amplamente cultivada na Argentina, mas era comumente vista como uma variedade usada para vinhos inferiores. A enóloga desafiou as convenções e passou a vinificar a Torrontés com o cuidado que ela merecia. A uva virou uma das grandes estrelas do portfólio de sua vinícola e rendeu a Susana o apelido de “rainha da Torrontés”.

Mas, além de conquistas, ela também sofreu vários revezes ao longo da vida. O maior deles ocorreu em 1994, quando sua primeira vinícola (fundada com Lovaglio Balbo, pai de seus filhos Ana e José) quase quebrou após sofrer um golpe. Resumidamente, a empresa recebeu uma enorme encomenda de vinhos. Susana, precavida, exigiu garantias e conseguiu que a transação tivesse um seguro. O temor da enóloga se materializou: os cheques recebidos não tinham fundos e, ao acionar a seguradora, a enóloga descobriu que a pessoa que a atendia não estava mais na companhia. Pior: também estava associada aos golpistas. No final, Susana conseguiu que a companhia de seguros pagasse 75% do prejuízo. Quitou as dívidas e vendeu a empresa. Jurou que nunca mais teria outra vinícola na Argentina e passou a trabalhar como consultora no mercado de vinhos.

Anos mais tarde, no entanto, acabou quebrando sua promessa. Em 1999, abriu a vinícola e fez questão de batizá-la com seu nome. “Colocar o nome em um vinho é um enorme compromisso com a qualidade”, diz Susana. “Porque, se ele fracassa, você é o responsável direto, é seu fracasso pessoal.” Não foi o caso. Em sua segunda empreitada como dona de vinícola, a enóloga mudou de estratégia e focou nas exportações. “Fazia meu vinho e ia abrir mercados no estrangeiro. Então, foi um projeto de sucesso”, conta. Hoje, aos 25 anos de existência, a vinícola Susana Balbo é uma potência no setor comandada por ela e seus dois filhos. José, o mais velho, coordena a equipe de enologia, e Ana é diretora de marketing. No Brasil, os rótulos integram o portfólio da Cantu Grupo Wine.

A caçula também é responsável pelo braço de turismo e hospitalidade da empresa. Em 2013, Ana inaugurou o restaurante Osadía de Crear, dentro da sede da vinícola, em Luján de Cuyo, no norte da província de Mendoza, aos pés da Cordilheira dos Andes. A cargo da chef Flavia Amad, o cardápio valoriza ingredientes sazonais locais com apresentações caprichadas e combinações deliciosas de sabores e texturas, como cordeiro com avelãs e limão e truta com ají amarillo e couve kale.

O hotel de Susana Balbo

Outra empreitada de sucesso da diretora de marketing com sua mãe é o Susana Balbo Unique Stays, um hotel-boutique que ocupa uma propriedade da família onde a própria Ana morou, também em Luján de Cuyo.

Inaugurado em 2022, o lugar é a materialização em forma de hospedagem do trabalho de excelência que Susana desenvolve em sua vinícola. São apenas sete suítes, nomeadas com princípios que norteiam a trajetória da matriarca, como OrigenCoraje e Audacia.

Da sala de estar decorada com obras de arte de artistas sulamericanos – incluindo uma foto do brasileiro Sebastião Salgado, presenteada pelo próprio a Susana – às espreguiçadeiras aquecidas nos jardins particulares dos quartos, tudo passa pelo olhar das fundadoras.

As acomodações são chamadas de “spa suítes” e, de fato, entregam o que o prometem. Cada uma é um pequeno spa particular: nas menores, com  64 metros quadrados, você pode submergir numa sedutora banheira em formato de ovo e curtir a noite em frente à fogueira em seu jardim privado, com uma taça de vinho escolhido na sua miniadega. Se preferir um banho de chuveiro, o box é um parque de diversões, com várias regulagens de saída de água: de uma delicada névoa a jatos potentes.

As suítes maiores, com 72 metros quadrados, dispõem das mesmas mordomias e contam ainda com uma sauna seca. Tudo isso em uma ambientação elegante e high-tech, onde você pode controlar a abertura das cortinas, as luzes e o aquecimento – incluindo do piso – com um tablet.

Caso queira uma sessão de massagem, uma esfoliação com sementes de uva ou outro tratamento disponível, você nem precisa abandonar seu refúgio. A terapeuta vai até lá, com todos os apetrechos necessários.

Com tantos mimos, nem dá vontade de sair do quarto. Mas vale a pena agendar um passeio para conhecer mais a fundo o trabalho de Susana Balbo. A pedido do hóspede, o próprio hotel pode organizar atividades, como degustações e visitas a vinhedos. Além do mais, voltar para sua suíte no fim do dia e encontrar a banheira quente, prontinha para um mergulho é, de fato, uma experiência de luxo em sua melhor forma.

A jornalista Patricia Oyama viajou a Mendoza a convite da Cantu Grupo Wine e da vinícola Susana Balbo.